Pessoas com diabetes estão entre o grupo de risco de diversas infecções virais por conta do processo inflamatório e enfraquecimento do sistema imunológico causados pela doença crônica
Segundo o Atlas de 2019 da International Diabetes Federation, o Brasil tem 16.8 milhões de pessoas com diabetes, ocupando o 5º lugar no ranking mundial. A estimativa para 2045 é de 20 milhões. E inevitavelmente, por conta de todo efeito que a doença causa no sistema imunológico e processo inflamatório, pessoas com diabetes estão sempre no grupo de risco de pandemias e infecções virais, como é o caso da Covid-19, que já dura mais de 15 meses no Brasil.
“Pessoas com diabetes e obesidade, que geralmente estão associadas, foram as mais predispostas à forma grave e mortalidade por Covid-19, independentemente da idade. O binômio ‘diabesidade’ é a real pandemia do século e se não tratada adequadamente serão sempre as mais suscetíveis em pandemias futuras” explica o coordenador do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Dr. Ricardo Cohen.
Em um estudo publicado na SOARD (Surgery for Obesity and Related Diseases) em janeiro deste ano, envolvendo 339 pacientes infectados pelo coronavírus que foram hospitalizados em Wenzhou, na China, a presença de diabetes foi associada a um risco cerca de quatro vezes maior da forma grave de Covid-19. Durante a pandemia de gripe H1N1, a obesidade e o diabetes também foram diretamente relacionados com maior mortalidade pela infecção.
“No Brasil, essas doenças sozinhas já são responsáveis por mais de 70% das mortes, principalmente por causas cardiovasculares, como infartos e derrames. O que observamos é que enfrentamos essas duas epidemias há décadas, sem grandes estratégias para combatê-las”, diz o médico.
Médicos, instituições e a Organização Mundial da Saúde apontam a preocupação com o controle de doenças crônicas e progressivas, enquanto o mundo ainda enfrenta a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.
“Muitos casos podem ter se agravado ainda mais durante o isolamento social. É importante salientar que estamos falando de uma doença silenciosa, podendo levar anos para manifestar sintomas, e as pessoas não devem negligenciar sua saúde. Além do uso correto das medicações já prescritas, o retorno ao médico é fundamental para ajustes necessários, a fim de manter a doença sob controle”, comenta a endocrinologista Dra. Tarissa Petry, do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Nos últimos anos, novos medicamentos surgiram e ampliaram as opções para o tratamento do diabetes. Entre os fármacos que podem ser indicados estão os análogos do hormônio GLP-1 e os inibidores da SGLT-2. Uma nova geração de insulinas também tem melhorado a posologia para os pacientes. Porém, mesmo com essas novas associações de medicações, a adesão não é fácil, segundo a endocrinologista. “A maioria tem dificuldades em tomar medicações corretamente e manter o estilo de vida saudável”, explica.
Em 2019, a Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas (Vigitel), feita pelo Ministério da Saúde, já apontava que 44,8% da população geral relataram praticar atividade física por tempo inferior ao recomendado pela OMS, de 75 a 150 minutos por semana, e apenas 34,3% afirmaram consumir regularmente frutas e verduras. “Podemos ter uma piora ainda maior desses hábitos, por conta de todo estresse causado pela pandemia. As pessoas devem manter ou retomar urgentemente a prática de atividade física, ter uma alimentação saudável e ficar de olho nas taxas de glicemia. Em caso de qualquer alteração, deve-se procurar atendimento médico”, orienta Dra. Tarissa.
O Coordenador do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz cita que entre 60 a 70% dos pacientes com o diabetes tipo 2 não apresentam controle glicêmico adequado. “Vivemos há anos uma epidemia global do diabetes, uma doença crônica e progressiva. Para os pacientes cuja doença não consegue ser controlada só com medicamentos ou insulina, a melhor opção é a cirurgia metabólica. Com a pandemia, podemos ter um aumento de pessoas que necessitem do tratamento cirúrgico”, diz Dr. Ricardo Cohen.
Benefícios da cirurgia metabólica
A cirurgia metabólica é definida como qualquer intervenção sobre o tubo digestivo que tem como finalidade o controle do diabetes tipo 2. Os resultados podem ser detectados já a curto prazo, já que entre 70 a 80% % dos pacientes que são submetidos ao procedimento cirúrgico não precisam mais utilizar a insulina para manter o tratamento da doença, e um número significante de pacientes pode diminuir o número de medicações ou mesmo não necessitar mais de medicamentos por via oral. Além de tudo isso, os pacientes tem perda de peso significante, controle do colesterol e da pressão arterial e redução de complicações renais e fundamentalmente diminuição do risco de eventos e mortalidade cardiovascular, que é o grande objetivo do controle da “diabesidade”.
Uma pesquisa do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, publicado na Jama Surgery em 2020, avaliou 100 pacientes e apontou que a cirurgia metabólica é o tratamento mais eficaz para impedir a progressão da doença renal crônica precoce em pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade O estudo detectou a remissão da albuminúria (perda da proteína albumina na urina, indicador de insuficiência renal) em 82% após a cirurgia metabólica (bypass gástrico em Y de Roux) e em 54,6% dos pacientes após tratamento clínico, com as melhores medicações atualmente disponíveis.
“A remissão de mais de 80% da albuminúria e das lesões renais a partir do tratamento cirúrgico significa evitar a progressão da doença e, consequentemente, reduzir a necessidade de fazer diálise e transplante de rins, além de diminuir fatores de risco que podem levar a infarto e acidente vascular cerebral (AVC)”, avalia o Dr. Cohen.
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