A não incorporação de medicamento para doença rara vem causando controvérsia no país

De Rafael

O medicamento para doença de Batten teve parecer negativo da Conitec, mesmo com consulta pública a favor da incorporação

A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC), finalizou em novembro do ano passado a consulta pública para incorporação do medicamento Brineura (alfacerliponase), que para a progressão da Doença de Batten, também conhecida como CLN2. A consulta teve o parecer positivo da população brasileira para incorporação no Sistema Único de Saúde (SUS), dispondo de 2,2 mil contribuições favoráveis ao tratamento, porém, mesmo com a aceitação da sociedade a Conitec decidiu por não incorporar, alegando que não existe evidências suficientes que o medicamento faça efeito.

É importante lembrar que a CLN2 é uma doença rara, ou seja, têm poucas pessoas no mundo com a enfermidade e consequentemente há poucas evidências científicas, como qualquer outra doença rara. Outro ponto necessário de ser pontuado é que existem cerca de 6 a 8 mil tipos de enfermidades raras, sendo que 30% dos pacientes morrem antes dos cinco anos de idade; 75% delas afetam crianças, 80% têm origem genética e apenas 5% das doenças raras identificadas têm um tratamento disponível, que poderia contribuir para evitar a progressão da doença e melhorar a qualidade de vida do paciente.1

A Comissão de Assuntos Sociais (CAS) organizou no último dia 23 de fevereiro um debate para discutir o tratamento para doença de Batten e o parecer negativo da Conitec, contando com a presença dos senadores Flávio Arns (Podemos-PR) e Mara Gabrilli (PSDB-SP). Além deles, Priscila Gebrim Louly, coordenadora geral de Gestão de Tecnologias em Saúde do Ministério da Saúde, Monica Aderaldo, Presidente da Federação das Associações de Doenças Raras do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, Dra. Mara Lúcia Schmitz Ferreira Santos, Neuropediatra especializada em CLN2, Cremilda Sena, mãe da paciente Isabella Cristina e Bruno Marinho, pai do paciente Francisquinho, também participaram da reunião.

No debate Bruno Marinho relatou sua indignação com as falas da chefe de gabinete da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde — SAES, Maria Inez Gadelha, na qual colocou em dúvida a luta de Francisquinho e de sua família para conseguir o tratamento, assim como os profissionais de neurocirurgia do Norte, de forma preconceituosa. Diante disso, o Senador Flavio Arns fez o pedido a comissão de transcrever a fala de Bruno e transformá-lo em um requerimento para demonstrar sua indignação a fala.

Monica Aderaldo, ressaltou durante o debate que essa luta pelo medicamento tem sido travada desde 2017, quando ocorreu o primeiro diagnostico de CLN2 no Brasil. Ela afirma que os maiores números de casos estão registrados nas regiões Norte e Nordeste, e quanto mais tempo o medicamento demorar para estar disponível, menos tempo de vidas essas crianças têm, colocando-as em uma situação de pena de morte. Ainda diz que a judicialização não é boa para ninguém e que o intuito dos responsáveis pelas crianças é evitar esse tipo de processo, pois com a incorporação no SUS o custo será menor para o governo em aproximadamente 11% e as crianças diagnosticas vão ter um tratamento rápido impedindo o avanço da doença.

A coordenadora geral de Gestão de Tecnologias em Saúde do Ministério da Saúde, Priscila Gebrim Louly, apontou que o impacto orçamentário é o maior impedimento para inclusão de medicamentos para doenças raras no âmbito do SUS. Porém, a Dra Mara Lúcia pontuou, em suas considerações finais, que a Conitec fala de impacto orçamentário, mas que ele já existe através da judicialização, ou seja, no final, vem todo do mesmo governo, então o impacto já existiria, porém de forma inadequada e tardiamente, a incorporação apenas faria com que o tratamento fosse feito da forma correta. Cremilda concordou com a Dra. Mara e reforçou que o impacto já existe, e que a vida dessas crianças não tem preço, mas sim valor.

CLN2 ou Doença de Batten

A CLN2 acontece em decorrência da deficiência da enzima lisossomal tripeptidil-peptidase 1 (TPP1), quando o gene que codifica a proteína está com um erro. É também considerada uma doença genética autossômica recessiva, isto é, em que há 25% de chance de acontecer novamente na mesma família a cada gestação2. Ela é caracterizada, por atraso/regressão da linguagem e crises epilépticas, que começam a partir dos 2 a 4 anos de idade, assim a criança perda de habilidades motoras e cognitivas que a criança já tinha adquirido. Com 5 a 6 anos de idade, a criança para de falar e de andar e já precisa de cadeira de rodas. Perda de visão e sinais de demência aparecem com 7 a 8 anos de idade. Dali em diante, o quadro evolui inexoravelmente para estado vegetativo, com a possibilidade de morte ainda na primeira década de vida3.

Veja também